Homem-Aranha 2

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Eu não costumo ver filmes na estréia, devido à precária condição dos cinemas paulistanos, onde a sessão da meia noite já está lotada ao meio dia e onde precisamos estar na fila duas horas e meia antes da sessão começar se temos amor pelos nossos pescoços. Nesse caso, contudo, abri uma exceção. Comprei ingresso uma semana antes e encarei algumas horas de fila para pegar um bom lugar. Agora, 24 horas depois do término da sessão, posso dizer que não só valeu a pena, como já estou com vontade de fazer a via-crúcis cinéfila de novo. Homem-Aranha 2 é fantástico!

O filme já começa detonante, com uma recapitulação das cenas mais importantes do filme anterior. O que deixa isso tão legal? É que essa recapitulação é feita durante os créditos e o melhor, é ilustrada por aquele que considero o melhor pintor de todos os tempos: Alex Ross.

Logo em seguida, o filme já dá o tom do que vem nas próximas duas horas: Peter sendo atazanado pela sua dádiva de ser o Homem-Aranha, perdendo o emprego e levando bronca do professor. Aliás, fãs do gibi devem ter reconhecido o nome do professor: Curt Connors que, ao tentar recuperar seu braço perdido (você reparou que ele não tinha um braço, não reparou?), se torna o temível lagarto, um dos vilões que mais quero ver no cinema, ao lado de Electro e Venom. Cruzem os dedos, nerds, quem sabe no próximo filme não vemos o Lagarto na tela grande.

Assim como no primeiro filme, a equipe criativa percebeu que o legal do Homem-Aranha é justamente não ser um daqueles heróis indestrutíveis e para os quais tudo dá certo. Como já disse inúmeras vezes aqui no DELFOS, o Aranha é um herói com quem os leitores podem se identificar onde sua identidade secreta, o Peter Parker é mais importante do que o próprio aracnídeo. Sabiamente, o pessoal centrou a história em Peter e nos seus problemas para pagar contas, para arranjar namorada e para cuidar da sua tia indefesa (que nem é tão indefesa assim, o Doutor Octopus que o diga). Isso aproxima o herói do espectador e nos faz gostar e torcer ainda mais por ele. Claro que torcer não adianta muito já que, assim como nos quadrinhos, tudo dá errado para Peter (e quem nunca se sentiu assim?).

Outra sábia decisão: o vilão do filme, Otto Octavius, mais conhecido como Doutor Octopus, não começa o filme como vilão. Ele é mostrado inicialmente como um cientista que visa melhorar as condições de vida da humanidade através de uma fonte de energia mais barata. Infelizmente, não é só para Peter que as coisas dão errado e um acidente acaba transformando o pobre cientista em um insano bandido. Esse tempo em que Otto é mostrado como um cientista “do bem” leva o público a gostar do personagem, chegando a ficar com pena quando percebe a iminência do acidente. E aqui cabe o primeiro defeito que vou apontar no filme (afinal, não é porque eu gostei muito que o filme é perfeito): uma vez vilão, Octavius se torna realmente um vilão, se é que você me entende. Talvez se ele ficasse meio dividido entre o bem e o mal, fizesse com que o espectador mantivesse a afeição criada pelo personagem no início do filme.

Para os nerds que estão lendo essa resenha e que verão (ou já viram) o filme, referências não faltam. Podemos ver desde personagens do gibi como Betty Brant (que chegou a namorar Peter no gibi) e Robbie Robertson (o editor gente boa do Clarim), até cenas classiquíssimas como a histórica capa com o uniforme do aracnídeo no lixo, imortalizada na arte de John Romita e agora reinterpretada em uma versão live action. Coisa de quem sabe o que faz e que conhece o produto em que está pondo a mão. Outro que está impecável e que ganhou uma participação maior que a do primeiro filme é o (hilário) dono do Clarim, J. Jonah Jameson, igualzinho aos gibis, tanto na personalidade quanto no visual.

Algumas pontas de ídolos dos quadrinhófilos (gostou da palavra? Acabei de inventar, significa “aquele que ama quadrinhos”) também podem fazer sua alegria. Como não poderia faltar, o criador do Aranha, Stan Lee está presente. O queridinho do diretor Sam Raimi e astro da série Uma Noite Alucinante, Bruce Campbell (que fez o locutor da cena de luta livre do primeiro filme) também reaparece aqui em um novo personagem. Claro que eu não vou contar onde esses caras aparecem, impedindo o amigo Delfonauta de brincar de Onde Está Wally durante a sessão.

Vou aproveitar que citei o diretor e continuar no assunto, além de dar mais uma de minhas polêmicas opiniões. Existem algumas profissões (tradutor de filmes, por exemplo), que você só se lembra que existe quando o cara faz algo errado. Eu costumo ver diretor de cinema mais ou menos dessa forma. Para mim, uma direção bem feita, é aquela que você não lembra que o cara existe. Se a câmera ficar tremendo, o filme for escuro demais ou as imagens ficarem fora de foco, eu já faço bico (aproveite e leia minha resenha para Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban e entenda o que quero dizer). Pois bem, Sam Raimi conseguiu uma façanha: me fazer lembrar que ele existia sem prejudicar o filme. Através de algumas mudanças de câmera estilosas e outras coisas que não vou contar para não estragar a surpresa. Com isso, Raimi me fez calar a boca e repensar minhas opiniões e olha, isso não é fácil.

Mas tem mais defeitos vindo por aí e esse míssil vai diretamente para as fuças de Raimi: por que diabos os personagens digitais estão tão falsos? Cara, tem cenas em que o Homem-Aranha ou o Doutor Octopus parecem tirados do jogo de Master System. Quem foi que aprovou esses bonequinhos? Porque eu realmente tenho dificuldade de aceitar que alguém que conseguiu recriar com tamanha fidelidade uma cena presente no inconsciente coletivo de todos os nerds do planeta (aquela da lixeira) teria a pachorra de aprovar um troço falso e ridículo daquele jeito. E se você puder me explicar, por favor faça aí nos comentários, porque eu estou perdendo o sono em busca dessa resposta.

Defeitos à parte, Homem-Aranha 2 é fantástico (eu sei que já falei isso, mas ele é mesmo, que eu posso fazer?). Arrisco até a dizer que é o melhor filme que já assisti. Claro que isso pode ser apenas a empolgação de ter acabado de assistir a um personagem que acompanho há 12 anos em sua segunda encarnação na telona e ainda melhor que a primeira, mas isso eu só vou saber quando comprar o DVD e puder assistir mais um monte de vezes (pena que não dá para comprar o DVD na saída do cinema). E já vou avisando, se a Columbia/Sony fizer a mesma besteira que fez no DVD do primeiro filme (lançar no Brasil apenas a versão em tela cheia), vou comprar importado mesmo e não quero nem saber. E você, se ainda não assistiu corra ao cinema para assistir, Homem-Aranha 2 é fantástico e eu vou repetir isso quantas vezes for necessário.

Lembre-se: “Com grandes poderes vêm grandes responsabilidades”, se todo mundo seguisse esse lema, nosso mundo seria bem melhor e mais justo. E que venham mais 7 filmes (se você não entendeu, leia aqui.

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Carlos Eduardo Corrales
Editor-chefe. Fundou o DELFOS em 2004 e habita mais frequentemente as seções de cinema, games e música. Trabalha com a palavra escrita e com fotografia. É o autor dos livros infantis "Pimpa e o Homem do Sono" e "O Shorts Que Queria Ser Chapéu", ambos disponíveis nas livrarias. Já teve seus artigos publicados em veículos como o Kotaku Brasil e a Mundo Estranho Games. Formado em jornalismo (PUC-SP) e publicidade (ESPM).
homem-aranha-2País: EUA<br> Ano: 2004<br> Diretor: Sam Raimi<br>